A lição que a palmada ensina
de Beatriz Oliveira
Há uns dias li uma notícia que relatava o despedimento de uma funcionária por ter dado uma palmada numa criança de 3 anos que fez cocó nas cuecas antes de chegar à sanita. À medida que lia comentários que ridicularizavam a decisão do despedimento e profetizavam uma geração de tiranos por falta de palmadas, sentia a indignação a crescer. Mas, já dizia Pedro Vieira, a indignação pode ser uma força motivadora em vez de destrutiva, se olharmos para ela como um convite a fazermos algo diferente para mudar o mundo, a darmos um exemplo diferente daquilo que nos indigna, a praticarmos a compaixão.
Independentemente do motivo, afinal o que é legitima uma palmada numa criança? Por que há esta necessidade de educar pelo medo? Quando vamos perceber que a integridade de uma criança vale tanto como a de um adulto?
Quando se discutem estas questões não tardam exemplos macabros, que vão desde filhos que batem em pais idosos a violações e homicídios. Crimes que ocorrem porque, defendem os comentadores, faltaram “palmadas na hora certa”. Será que foi mesmo isso que fez falta? Será que a empatia pelo outro se ensina mostrando que há pessoas que valem mais que outras e que é legítimo que uma pessoa com mais poder (neste caso, o adulto) agrida outra com menos poder (neste caso, a criança) para obter obediência? Será que um filho criado numa relação em que se ensina o respeito pela integridade física e emocional de todos os membros da família é o filho que vai agredir os pais ou outros?
“A falta de respeito para com os adultos hoje é muito maior do que antes e isso vem de algum lado! Uma palmada não faz mal a ninguém. Eu também apanhei e fez-me bem!”, dizem muitos. Em primeiro lugar, penso… será verdade? Em segundo lugar, inspiro, expiro, e tenho muita compaixão. Compaixão por tantos pais, avós, educadores que, porque até à data não têm mais recursos, agarram-se a crenças culturais enraizadas para justificar o seu comportamento no passado… Gostava de lhes poder dizer: é possível fazer diferente!
Não bater não significa deixar as crianças fazerem tudo o que querem. Não significa não educar, nem ser negligente. Significa querer ter uma relação de amor onde não há medo, mas respeito. Onde na relação todos têm o mesmo valor e se ensina o respeito por todos, independentemente da faixa etária, género, profissão, religião. Onde se ensina, através do exemplo, a empatia, e que numa relação não temos o direito de ferir a integridade do outro.
“Então, e como é que se ensina?”, perguntam-me, tentando pôr-me em cheque quando retiro as palmadas da equação. Convido à reflexão: como é que nós (sim: eu, tu, nós) aprendemos? Hoje sabe-se que a palmada não só não é eticamente aceitável, como é ineficaz e contraproducente, que crianças que levam palmadas têm tendência a tornar-se mais agressivas. Mesmo quando, a curto prazo, parece funcionar… funciona… a que custo?
Uma palmada ensina uma lição, é certo: ao bater podemos obter o que queremos de pessoas que se encontram numa posição mais frágil que nós. É esta a mensagem que queremos transmitir?