E agora?
A vida traz-nos tempestades, verdadeiros tufões que nos levam aquilo que temos como mais certo, como o que julgamos ser o nosso porto seguro. E, nestas alturas, quando estamos mais desprotegidos e vulneráveis resta-nos fazer uma escolha. Escolhemos seguir em frente, com os olhos meio vendados, acumulando novas experiências, reconstruindo o nosso porto de abrigo de uma maneira frágil e pouco consistente, ou escolhemos atrasar um pouco esse reerguer e vasculhar primeiro no baú, procurar a nossa essência, procurar o que somos, o que gostamos de fazer, o que é isso de paz e harmonia, o que nos dá tranquilidade e nos permite estar mais conscientes da nossa verdade enquanto seres humanos, enquanto seres que tivemos a maravilhosa oportunidade de, simplesmente, viver!
As palavras que se seguem tiveram a honesta vontade de não avançar numa escolha de vida mais consciente sem antes refletir sobre as minhas intenções aqui e agora.
Quando me divorciei há algum tempo, depois de um casamento de vários anos e quatro filhos, o meu mundo desabou! Relembro hoje, que uma das minhas principais inquietações era a vontade de ser uma mãe diferente. De uma forma muito ténue sentia que não conseguia, que não podia mais, viver uma vida que, aqui dentro, não fluía. E, como tal, não estava a ser a mãe Bárbara. Estava antes a ser uma mãe que a sociedade esperava. Esta noção vem agora mais clara e simples, no entanto, resulta de muitos anos de procura, desânimo, tristeza, reencontros, introspeção, pequenas alegrias e de muita paciência.
Partilho uma imagem que me acompanhou desde o início desta aventura: uma maratona na marginal de Carcavelos…todos corriam dentro daquelas linhas limítrofes e eu, eu tinha saído para fora e corria para a praia. Só não sabia que direcção escolher, que ondas apanhar e muito menos quando estender uma toalha na areia…apenas sentia, algures aqui dentro sentia que aquela saída estratégica estava certa! Isto ensinou-me a começar a ouvir a minha intuição, a respeitar as minhas escolhas e a acreditar que “está tudo bem”. Durante muito tempo tinha na minha carteira um recorte de uma revista que dizia “Keep it simple”. Foi uma forma de aliviar o peso de todas as dúvidas, receios e decisões que assombravam a minha mente. E foi no meio desta azáfama que a vida foi-me dando a enorme ajuda de me colocar à frente pessoas, livros, reflexões, retiros, montanhas, insights que me protegeram e foram a minha nova bússola! Que grata estou!
O caminho faz-se caminhando, e posteriormente vim a descobrir que o meu coração batia. Que tinha um e que gostava de ser ouvido! Lembro-me desse momento com muita emoção. Como foi possível durante tantos anos não me ter apercebido da sua presença, da sua sabedoria? Como foi possível? Hoje, continuo a fazer um esforço para o escutar sempre! Fui eu, o meu passado e as minhas escolhas que me trouxeram esta distância dele…que bom que sei agora que não quero, nunca mais, viver longe do meu coração, que jamais o vou deixar de ouvir!
Reflectindo sobre estes tempos de procura, percebo que a minha intenção inicial e gritante era compreender que pessoa é esta com quem vivo todos os dias? Com quem converso, com quem choro e sorrio, com quem durmo e acordo, com quem danço e me alimento, com quem enfrento desafios, com quem cresço? Este conhecimento é, e ainda bem, uma descoberta sem uma meta estabelecida. Mas esta é uma procura especialmente solitária que, por vezes, exige momentos profundamente inquietantes e tristes. Que exige resiliência e acreditar que, em nome do nosso crescimento pessoal, não desistir vai levar-nos a ser uma mãe, uma amiga, uma companheira, uma profissional, uma pessoa melhor! Escrevo solitária porque é especialmente quando não fujo do silêncio, dos momentos em que aceito que são de mim para mim, eu e o mundo, eu e o meu coração, que encontro respostas, que encontro uma paz e uma alegria de viver arrebatadoras. Mas isto também me obriga a uma consciência, cada vez mais clara, que a sociedade em que me movimento é, por vezes, diferente. Sinto tantas vezes que fico desprovida de energia quando estou muito tempo perto dela! E é nestas alturas que me refugio no silêncio, nos meus filhos e nas verdadeiras amizades, tão maravilhosas e cheias de luz! Na verdade, sinto que procuro tempo, tempo para estar perto de mim, para me sentir habitada. Este tempo de que escrevo sinto-o precioso e necessário para continuar o meu caminho. E é aqui que surge a necessidade de fazer escolhas, por vezes tão difíceis de tomar!
Acredito que esteja a seguir o atalho certo porque hoje tenho plena consciência que um sorriso, um abraço ou um reconhecimento me confortam imensuravelmente, e que é mesmo na simplicidade das pequenas coisas que encontro harmonia, motivação e força para continuar.
E assim, qual a minha intenção aqui e agora? Comigo, a minha intenção é conhecer-me cada vez melhor. Conhecer-me de forma a sentir, compreender, aceitar e viver a vida, e os momentos felizes e turbulentos que inevitavelmente trás com ela, com harmonia, mantendo presente que tudo é impermanente e que a perspetiva com que olhamos as situações pode fazer muita diferença. Conhecer-me tão intimamente, que consiga honestamente compreender o que é realmente importante para mim! Para isso, preciso de continuar a procurar momentos de qualidade comigo própria. Seja no silêncio, na família, com os amigos, no trabalho, no ginásio, com ou sem música, com ou sem sorrisos… apenas momentos de qualidade! Acredito mesmo que por agora esta é a melhor forma da vida fluir ao encontro de uma pessoa feliz, de uma mãe feliz. E, então, a minha intenção como mãe? Trazer harmonia ao nosso lar, para que possamos todos crescer com a certeza que vamos falhar, que vamos vencer, que vamos lutar, que vamos ser cúmplices, que vamos sorrir…e que seremos sempre amados pelo que somos. Que esta família seja um porto seguro, hoje e quando a recordarem, no futuro, no seio das famílias que constituírem. Precisamos de harmonia para nos conhecermos e para termos disponibilidade para nós e para os outros. Eu preciso, para ter este detetive activo e conseguir estar presente para eles enquanto crescem e enfrentam o mundo. Só assim poderei deixar para trás os julgamentos de comportamento, as análises baseadas em padrões e não nos seres individuais que são…só assim poderei estar atenta às suas verdadeiras necessidades emocionais. E eles precisam, para serem livres, e avançarem gratos, alimentando as suas sementinhas do respeito, resiliência, alegria, amor e compaixão por eles e pelo mundo, com a certeza que são perfeitos na sua imperfeição.
Em jeito de resumo, acrescento que Sem esforço foi a atitude mindfulness que escolhi há uns tempos. Passaram uns meses e fico muito feliz quando olho para ela e sorrio…essa intenção está a correr bem. Talvez hoje a minha atitude seja de resiliência!
Por fim, e porque hoje ocorreu-me com uma clareza especial, escolho a palavra conexão para terminar. Já li esta palavra tantas e tantas vezes e nunca tinha tomado verdadeira consciência da sua dimensão! Todos precisamos de conexão! Conectamos através de todos os nossos sentidos, com todas as nossas células. Conectamos com tudo o que nos rodeia externamente e internamente. Conectamos porque existimos! Toda esta loucura das redes socias, das amizades e paixões de curta duração, do imediato e emergente que nos sufoca todos os dias é uma procura de conexão. Mas será que o ser humano não se perdeu na forma como escolhe essa ligação? Será que não percebemos que para uma verdadeira conexão, honesta, completa e que nos dá sentido aos nossos dias, é preciso disponibilizar tempo e amor, é preciso autenticidade? Será que nos esquecemos que é preciso estar presente? Presente aqui e agora, para os outros e para nós. Presente para observar, sentir, comunicar, abraçar e sorrir.
Sorrir! Sorrir para a vida porque, e citando Thich Nhat Hanh, “Life is available only in the present moment, and we already have more than enough conditions to be happy”.