“Sempre soube dar a palmada certa na hora certa”
de Maria José Pita
“Sempre soube dar a palmada certa na hora certa.” Disse-me hoje uma mãe quando soube que eu era coach parental (mais concretamente, facilitadora de parentalidade consciente).
Informei a Senhora que a palmada não faz parte das estratégias que usamos nesta abordagem, que se transformou para mim, e para muitas das minhas colegas da Academia de Parentalidade Consciente, em algo mais perto da filosofia de vida do que do estilo de educação. A Senhora ficou perplexa e respondeu-me:
-Bem, na verdade, eu também não dou muitas palmadas, invisto mais nos castigos! Uma das minhas filhas canta fado e se faz alguma… tenha um espectáculo onde tiver, é certo e sabido que não vai cantar e cantar é a coisa mais importante para ela!”
Lá respondi que também não alinhávamos nos castigos, que não os usávamos.
Nesta fase, a Senhora já não sabia que mais dizer… Disse, referindo-se a mim: “A Senhora não faz ideia do que é ter uma filha adolescente….!!! ao que respondi: ” De facto, apenas sei o que é ter 3 filhos adolescentes”.
A Senhora, que aparentemente procurava apresentar-me uma estratégia relativamente à qual eu lhe dissesse que concordava e que ela usasse, retorquiu:
-Sabe, ultimamente, o que faço principalmente é negociar… digo-lhe: Ou fazes como eu quero, ou não vais cantar!
A Senhora, verdadeiramente bem intencionada, aguardava pela minha resposta…
Estou certa de que, tal como eu, esta mãe faz o melhor que pode e sabe, e não era de todo minha intenção fazê-la sentir mal ou culpada ou outra coisa qualquer que não fosse dizer-lhe que existem outros caminhos mais agradáveis para pais e filhos, que esses outros caminhos nos ajudam a nós e aos nossos filhos a construirmos, em conjunto, relações mais significativas e que nunca é tarde para ver outras realidades.
Nunca é tarde para nos questionarmos sobre se queremos mesmo continuar a fazer como fazemos ou se, por outro lado, queremos experimentar algo que promova a ligação em vez de promover a obediência.
Ouço muitas vezes referir que antigamente havia muita obediência e respeito, que na escola não havia ninguém que questionasse a autoridade do professor e que em casa a palavra dos pais era uma ordem, uma lei. Ora, com a democratização do acesso à informação, com as necessidades básicas satisfeitas, com o aumento do nível de consciência, como poderiam as crianças e os jovens manter-se no mesmo paradigma?
Hoje, nem as empresas são como no passado. Claro que ainda existem empresas que funcionam num modelo tradicional, em que um patrão ou um chefe dá ordens e os colaboradores obedecem. A estrutura é rígida e ninguém tem “voto na matéria”. Será que os colaboradores estão satisfeitos? Será que a empresa irá ter muito sucesso no mercado dos nossos dias, num horizonte temporal alargado?
Quando vemos colaboradores satisfeitos e realizados, em que empresas trabalham? Em empresas tradicionais, que funcionam “à antiga”, ou em empresas em que os colaboradores podem usar os seus recursos todos e isso é valorizado?
É fácil responder, certo? Hoje todos conhecemos empresas onde os colaboradores são felizes e onde se cultiva a felicidade.
Sabendo que uma família não é uma empresa, sabemos, no entanto, que pais e filhos têm acesso a informação e que hoje, mais do que nunca, se fala em felicidade como um caminho, como um objectivo. Então, como podem as crianças e os jovens aceitar que um caminho de não felicidade, de não ligação, de castigo, seja o escolhido?
Boas pistas nos estão a dar crianças e jovens sobre a necessidade de criar um novo paradigma ao não aceitarem o que à força lhes estamos a impor, num mundo em que o modelo atual não faz sentido. Parece-me mesmo muito bom sinal, sinal de resposta adequada das crianças e dos jovens a modelos cristalizados que assentam no medo de não ter crianças bem comportadas, bem sucedidas, mais do que na vontade de criarmos relações significativas e de procurarmos o que de mais significativo nos caracteriza enquanto seres humanos e que é a possibilidade de, de forma concertada, nos articularmos, tendo em vista um objetivo comum.
No episódio acima, em que uma senhora procurava ter a minha concordância para os seus métodos (assim me pareceu), um dos meus filhos acompanhava-me e testemunhou o diálogo. No final, não tendo havido espaço para que acontecesse algo mais útil do que partilhar que existem outros caminhos possíveis na parentalidade, caminhos que proporcionam relações mais saudáveis e significativas, fomos tranquilamente para casa, imaginando se a filha daquela Senhora estaria satisfeita com a relação que tem com a mãe.
Se quiserem conhecer alternativas à parentalidade tradicional, e conhecer uma possibilidade de criar mais ligação, mais tranquilidade e relações significativas, podem aceder a mais informação em: https://blog.academiadeparentalidade.com/. Se sentem que querem mais do que pesquisar, podem contar com o apoio profissional de um(a) dos(as) facilitadores(as) da Academia de Parentalidade Consciente.